quarta-feira, 24 de abril de 2013

Impressionismo




A linha em movimento. Pelas costas nuas, corriam minhas mãos e minhas tintas. Tentei copiar uma obra de arte em sua pele, fiquei no meio do caminho. Como querer ser Degas? A minha bailarina sente cócegas quando a caneta escorrega pela costela. Treme o traço. Dançou com os olhos. Dançou sem perceber o que o corpo fazia, cantou sem compreender o que a letra dizia. A tinta sobre a pele dura pouco, o significado daquele momento é um pra sempre entre nós.

O pra sempre mora onde passa rápido, também é movimento. Nossas telas estão na sua casa. Meu rosto, o dela. Minha alma, a dela. Sua história, a minha estória. Tintas de todas as cores, cores que não sei o nome. Ainda não inventaram a tela que queremos, nem por isso faltam desenhos. Ponto a ponto, pixel a pixel. Somos anônimos que se sentem reconhecidos, temos nossos nomes por todos os lados. Lembram da gente na rua, nunca sabem de onde. A importância de poder entrar onde quiser sem precisar de convite. Somos o Impressionismo sem precisar de pós. Nada de violência, ela já passou. As orelhas ficam no lugar.

Termino o desenho da nossa brincadeira depois de algumas horas de trabalho. Ela se maravilha, mas sei que podia ser muito melhor. Como as minhas estórias. De lei, sou repreendido. Tenho que escrever mais pra ser mais lido, sentencia. Sorrio, a bailarina dança sobre mim. Fecha os olhos e se apaga no sono. Antes de acompanhá-la, as palavras rolam sobre a tinta.

- Minhas estórias não estão esperando serem lidas, eu acho. Estão esperando serem lindas. Eu acho.


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"O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato/ O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço/ O amor comeu meus cartões de visita, o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome/ O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas/ O amor comeu metros e metros de gravatas/ O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus? O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos/ O amor comeu minha paz e minha guerra, meu dia e minha noite, meu inverno e meu verão/ Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte" - Dos Três Mal-amados, Palavras de Joaquim - João Cabral de Melo Neto