- Não, Claudiney! É pra usar o vermelhão! Não me venha com esta porcaria.
- Mas dona Roberta, vai ficar parecendo uma amiga da Punk, a Levada da Breca.
- Não! Você é um viado que não entende de nada. Coloca que vai me rejuvenescer.
- Você quem sabe...
- Mas dona Roberta, vai ficar parecendo uma amiga da Punk, a Levada da Breca.
- Não! Você é um viado que não entende de nada. Coloca que vai me rejuvenescer.
- Você quem sabe...
***
Soco na pia, mesmo
sabendo que isso só vai deixar a mão inchada. Ele não vem, ela já
sabe que ele não vem. Disparou quatro mensagens antes de chegar ao
desespero. A primeira queria confirmar, ver se tava tudo certo. A
segunda perguntava do vinho, se ele preferia mesmo o merlot, um
cabernet-sauvignon cairia tão bem... A terceira foi só o horário
que marcava no pulso, “23h48”. A quarta foi pra lembrá-lo de que
só um grande filho-da-puta faz uma mulher sofrer na depilação
íntima pra dar um bolo magistral daquele. Mesmo que as putas,
coitadas, não tivessem nada a ver com aquele episódio triste.
Sentada, sozinha no
apartamento pequeno que lhe coube na tão mal-acabada Copacabana,
sentindo as virilhas arderem, começou um ritual de gritos e
sacrifício de roupas. O vestido foi sendo arrasado com as unhas, as
unhas foram se arrasando no vestido. No choro de raiva, salivava e
desmontava a maquiagem. Não aguentou ver o que uns 60 anos lhe
deixaram no espelho e ali, no reflexo, plantou com força o salto.
E sacudia a cabeça com violência pra negar que se sentir mulher dependesse tanto assim da sua vagina. Que ele ter sorrido e piscado era algo tão poderoso. Que ficar molhada do banho na cama, se masturbando por horas ao pensar no corpo dele, tivesse sido tão bom. Dois dedos no clítoris, “a língua dele devorando assim”, uma mão quase inteira dentro dela, “um volume nas calças, deve ser enorme, ain”.
E sacudia a cabeça com violência pra negar que se sentir mulher dependesse tanto assim da sua vagina. Que ele ter sorrido e piscado era algo tão poderoso. Que ficar molhada do banho na cama, se masturbando por horas ao pensar no corpo dele, tivesse sido tão bom. Dois dedos no clítoris, “a língua dele devorando assim”, uma mão quase inteira dentro dela, “um volume nas calças, deve ser enorme, ain”.
- UM ENORME
FILHO-DA-PUTA! UM MERDAAA!
Ainda que as putas, injustiçadas, estivessem montando sindicatos pra serem profissionais
respeitadas e não tivessem nada a ver com aquilo. Tampouco os coliformes
fecais do Rio de Janeiro.
Não era amor, saravá!,
não, era carne e osso que ela queria. Fazia tanto tempo... Não
suportava a ideia de ir a um baile da terceira idade. Menos ainda
pagar pra fazer sexo, ainda que sua irmã mais velha oferecesse um
cardápio de gigolôs no telefone. Queria a espontaneidade, a
veracidade da sedução. Ser jogada na parede, despertar tesão
genuíno, se empoderar do próprio corpo. Queria ser objeto, talvez
até descartável, mas puta que pariu, que a descartassem depois de
usar!
Seu Arnaldo subiu da
portaria pra ver se ela estava bem. Ele morria de medo de algum velho
morrer no seu turno. Bateu na porta, mas ela continuava em histeria
lá dentro. Ela gritou pra ir embora, que ela estava bem, só estava
chorando e “pouco apresentável” pra abrir a porta.
- Um parente morreu,
Arnaldo! Sai daqui e me respeite, estou com o rouge todo lavado no
rosto.
Em um relance de
pensamento, ela julgou que ele jamais teria a sensibilidade pra
entender que a ausência de sexo tinha se tornado o sexo dela. Um
gênero neutro de libido, frustração e autopiedade. A profundidade
do seu ser feminino violado por aquele grandessíssimo
filho-de-uma-égua, ainda que as pobre éguas... Ele era mais um
macho babaca com medo de ambulância, com medo da morte, não merecia
ver a morte ali, no peito dela.
Quanto ao seu Arnaldo,
desceu as escadas ponderando. "Foi melhor não lembrá-la
que rouge está substituído por blush desde 1992".