- Você sabe como ser bonito!
- Hahaha, ok, me explica isso.
- Você é bonito, claro. Mas tá longe de ser arrogante. Não fica inseguro perto de mim. E olha que sou uma armadilha com sotaque.
Ela está me mantando em seu coração.
Hoje, dá pra sentir pelas palavras escassas, pela distância que não é só física. E eu, sentado em minha cadeira robusta de madeira na varanda da casa, assisto com uma expressão de desolação irônica. Eram altas as chances disso acontecer, não eram? Não sou um apostador. Então quando entro no jogo, entro pra perder.
Invadi aqueles ventrículos e átrios, fui um choque anafilático, o sangue venoso que ainda não sabe por quais veias correr. Tudo tão rápido, tão taquicardíaco. Agora, lentamente bombeanto em suas funções regulares, vejo meu espaço encolher. Como se a minha mansão nesse miocárdio tenha que minguar até que o quarto-e-sala onde estou agora desapareça. Em um infarto fulminante eu nasci e morro por insuficiência cardíaca. Se encerram os blips-blips do monitores. Blip, Blip.
O peso do amor, do começo, sim, eu sabia. Assim como nunca me enganei, aqueles hectares musculares tinham outro morador. Cohabitat. Ela pode se amarrar em terra firme, se firmar em seu inquilino de longa data. Não sei, não sou.
Naquele abraço perdido em um corredor do meu apartamento, nus e em lágrimas, ela sentia saudade daquilo que não tínhamos vivido. Como aproveitar um amor em antecipação, esperando gritos e sonhos não realizados, cortes profundos em estômagos rasos de tamanha ansiedade? Como ser um humano se caminhamos vazios um do outro, no nosso afobamento linear de quem não pensa no futuro? Fomos do agora, um agora que já passou.
De vez em quando, sussuro os trechos entrecortados de Walt Whitman.
"This wind is our deepest bond. And I wish things had started before they finished".
Eu estou matando-a em meu coração.