segunda-feira, 19 de novembro de 2012

O pequeno homem-leão


Areia movediça engolia a coragem do pequeno homem-leão. Parecia estar tudo tão bem no começo... Mas alguma coisa dava errado. E outra seguindo. E acolá vinha de novo. E quanto mais ele se sacudia, mais afundava. O desespero que vem, assoma, arrebata e arrebenta. Não é assim a história, meu amor? Antes você me contava, era tão bom. Era sem chave, agora sou cópia sem saber qual porta abro.

Andava emaranhado com a cidade e seus desejos esticados pela areia fina. Novembro passava. Sentia o corpo ardendo com o sol de vaidades que banhava a praia larga. Tantos afoitos forjando intimidades, terra de meio-sorrisos, os perfeitos que davam defeito. Eram licores sem cores, o puro álcool evaporando sal do mar. Era tudo ressaca.

Era um Rio de Janeiro e Novembro passava em sua vida sem portela.

Entre uma e outra estação, fingia ser Primavera pra todo lado, tinha que esperar pela sua hora. Se sentia enjaulado e diminuído pelos relógios. Preso em um mundo de frases pré-moldadas, qualquer um podia edificar a próxima curva da vida. A solidão se apoderava, o cão negro do vizinho que mostrava os dentes e já não tem mais coleira. Entrou em uma loja pra comprar um paletó novo. Chorou como uma criança dentro do provador e saiu como se nada tivesse acontecido.

Tudo isso era a cidade do sol em dia de chuva. A confusão lá dentro não tem zona, qualquer grande túnel sem a luz no fim. Ela sofria saudades em um céu de brigadeiro. E ele não sabia nem como esconder própria dor. Vazava e pedia. O silêncio cuidava de cumprir a missão dos rugidos. Os gritos do pequeno homem-leão moravam nas respostas que nunca eram dadas às perguntas.

Novembro. O fim da história eu sempre esqueço, meu amor.




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"O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato/ O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço/ O amor comeu meus cartões de visita, o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome/ O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas/ O amor comeu metros e metros de gravatas/ O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus? O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos/ O amor comeu minha paz e minha guerra, meu dia e minha noite, meu inverno e meu verão/ Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte" - Dos Três Mal-amados, Palavras de Joaquim - João Cabral de Melo Neto