domingo, 7 de outubro de 2012

Ir embora e o vento que corta




Malas, sempre elas, mas dessa vez não eram minhas. Ela calculava o choro na medida em que colocava sapatos e coisas dentro das abas de pano e plástico. As despedidas minavam sua vontade, reproduziam seus medos, faltas, vazios, dúvidas e carências. E no fim, as malas. Elas sempre ficam lá, se esgueirando à espera do momento de carregar as coisas pela janela.

E o vento que corta, meu amor? A secura daqui? Os dias tão sem samba? Eles vão ficar pra trás, e a cidade que é tão mais em seu coração, agora é uma realidade. É... Não. Mesmo isso não consola a dor. Os pés descalços já se acostumaram com o terreno do quintal, pisar em ovos não é bem o planejado. Flutuar enquanto dorme é a solução na casa do futuro. Os planos, tantos planos.

As lágrimas de quem fica no canto da saudade, o lábio que treme na hora do beijo no rosto. Não era pra ser assim, era pra ser mais fácil, mas o “mais fácil” não tem de pote, não vem pra hoje. Enquanto toco as notas de um jazz da calma, ela vive o desapego mais profundo, o salto do ninho. Sou o observador da dança, um passarinho. E minhas asas não se comparam às dela.

A revoada está prestes a começar. Olha bem pro horizonte. Ela vai se perder em meio aos pássaros da brisa. Está prestes a começar.



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"O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato/ O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço/ O amor comeu meus cartões de visita, o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome/ O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas/ O amor comeu metros e metros de gravatas/ O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus? O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos/ O amor comeu minha paz e minha guerra, meu dia e minha noite, meu inverno e meu verão/ Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte" - Dos Três Mal-amados, Palavras de Joaquim - João Cabral de Melo Neto