domingo, 3 de março de 2013

O peso do amor dos outros




Ouvi a moça dizer "eu te amo" e acabar com um possível amor. Foi tão rápido, tão doloroso, tão constrangedor. Eu ali, comprando o Globo na banca, e ela olhando pro homem grisalho com olhos impiedosos de quem não tem mais o próprio coração.

No rosto dele veio a resposta, susto de "Ai, meu Deus!", tão cruel e tão honesto que jamais poderia ser recriminado. Talvez tudo o que ele quisesse fosse amar também, só faltou aquilo que não tem nome e ninguém sabe onde é que fica, ninguém viu ou deu bom dia, nunca votou e não paga imposto, aquela coisa que desperta e faz sentir infinito.

Escondo os olhos no jornal enquanto pago, o jornaleiro disfarça contando o troco. Se conhece bem o pesar das testemunhas, dos dois no meio do caminho. E lá se vai um crime sem perdão que é justo deixar impune.



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"O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato/ O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço/ O amor comeu meus cartões de visita, o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome/ O amor comeu minhas roupas, meus lenços e minhas camisas/ O amor comeu metros e metros de gravatas/ O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus? O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos/ O amor comeu minha paz e minha guerra, meu dia e minha noite, meu inverno e meu verão/ Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte" - Dos Três Mal-amados, Palavras de Joaquim - João Cabral de Melo Neto